quarta-feira, março 19, 2008

14.

Manuel Pequeno, o Piças, entra de novo na taberna. Pede mais um copo de cachaça. Não tarda que as suas pernas e os seus braços, e depois o corpo todo, comecem a traí-lo em movimentos de circo. O ruído sobressaltado de um motor leva-o à rua. A camioneta da carreira sobe vagarosamente a caminho do largo como se chegasse de uma viagem à roda do mundo. Oito passageiros procuram reconhecer as bagagens de entre uma nuvem de pó. Um desconhecido tira o relógio do bolso do colete. Lalice estende na rua um caibro de quinze arrobas. Pedro mistura na manhã de fins de Setembro (como nos romances sul-americanos) um odor intenso a alecrim. O doutor Magalhães, na varanda da casa do largo, acaba por sentar-se na cadeirinha de lona e enfiar as patas na bacia de porcelana. Manuel Pequeno cambaleia por instantes, olha de novo a circunferência do largo. O filho, mais uma vez, não chegou à Vila: como se a camioneta da carreira não acrescentasse nada ao mundo conhecido. Do outro lado do vale, sobre a cumeada, um milhafre continua a planar como se tudo estivesse conforme com a ordem do mundo.