quarta-feira, março 05, 2008

5.

O Inverno começava com a sementeira do centeio e os carretos de mato. Queimadas as cavadas, em terreno onde mal entrava o arado, assim fertilizada a terra escassa com as cinzas dos torrões, era o tempo de tirar os guiços dos telheiros e as rachas de carvalho – e começava o Inverno. As noites iam arrefecendo por altura das escanadas do milho; insinuavam-se os namoros nos bailes de realejo; principiavam os serões sucessivos. Os homens adormeciam nos escanos ou, em havendo companhia, ficavam sentados à lareira a beber vinho, a jogar à sueca ou a tentar a chiadela na bisca do nove; as mulheres bordavam enxovais, enchiam as rocas de lã, faziam os fiandeiros para os cobertores, fiavam o linho dos lençóis e das colchas, rasgavam as tiras de roupa velha para os liteiros e os tapetes. Vinha então o vento da barra, a geada e o sincelo, a neve: o tempo corria suspenso de fios invisíveis. Os homens tiravam das cortes os estercos velhos, matavam os porcos que penduravam nas traves das adegas por uma soga de cabedal, aricavam os centeios. As mulheres, houvesse ou não houvesse serão, ficavam em casa. No seu pequeno e imenso mundo. A guardar a casa e o mundo e a garantir que os ramos da oliveira protegiam as suas crianças e os seus homens da tempestade e do relâmpago. (E isto quer dizer o quê?)