(Onde Aline é atravessada por uma imprevista melancolia)
Aline imprime em duas folhas os textos que acaba de escrever. Levanta-se da mesa, vai à varanda, fuma um cigarro. Olha os barcos e o rasto de prata que deixam nas águas, as paredes cinzentas dos antigos armazéns, a alameda de lódãos e a estrada com automóveis correndo a caminho de lugar nenhum. A tarde declina. A sombra começa a descer sobre os telhados e as árvores da cidade. A noite trará as sua luzes, os candeeiros das ruas e das praças, os faróis acesos, o néon, as lâmpadas das casas e dos apartamentos a desenhar-se nos rectângulos das janelas; a noite trará os seus silêncios, os seus segredos, a inquietude. Aline entra de novo, senta-se de novo à mesa. Relê os textos que acaba de escrever e compreende, na memória viva dessas imagens dispersas, a impossibilidade da narrativa. Sorri. E invade-a a estranha melancolia de quem recupera uma parte do mundo que julgava ter perdido para sempre.