quarta-feira, novembro 28, 2007

Um dia

Um dia disse: estou farto de poemas. Ninguém o levou muito a sério. Tinha começado o Inverno, tinham chegado os primeiros dias frios, a lareira acesa.

Ver

Uma árvore é um universo
em expansão afundando as suas raízes
em direcção ao passado e os seus ramos
em direcção ao futuro. Olhaste tantas vezes
a gleditsia da ponte vindo de casa a caminho
do padrão e nunca verdadeiramente
viste nenhuma das suas folhas e nenhum
dos seus espinhos e nenhuma
das sua vagens. As mais das vezes
conhecemos as coisas pelos seus nomes
e nunca chegamos a vê-las.

segunda-feira, novembro 26, 2007

Cartaz moderno

jcb

quinta-feira, novembro 22, 2007

quarta-feira, novembro 21, 2007

Noite

jcb

domingo, novembro 18, 2007

Letra de canção (outra)

Há tantas coisas
que passaram
já de moda
o um de maio
os rebuçados
de mentol
o gira-discos
a disquete
a arte nova
a anorexia
o casamento
o rock and roll

Há tantas coisas
que pertencem
ao passado
a pedra pomes
os exames
do liceu
o sabonete
a limonada
o frango assado
as persianas
o amianto
o coliseu

Mas entretanto
é outro o tempo
o dia-a-dia
o jornalismo
de polícia
as adopções
pão integral
a paridade
a ecologia
o ecoponto
a reciclagem
os vidrões

Há tantas coisas
que pertencem
ao que vês
o baixa-a-bola
a opção táctica
dum trinco
o almerindo
o ponto.com
o corte inglês
a banda gástrica
a asae
o ornitorrinco

Predador

O predador deve ter frio
porque sobe sempre as golas
dos casacos.

sexta-feira, novembro 16, 2007

Não: é verdade

Não é verdade que os amigos não morrem.
Os amigos morrem quando a morte
os leva com a sua faca de cortar o gelo no diamante
dos lagos da península. Os amigos morrem
e não é verdade que regressam
na memória de os lembrarmos
ou nas fotografias e nos papéis amarelecidos
dos seus nomes. [Não

sei: ao dizer que os amigos não morrem
enquanto nos lembrarmos deles
talvez procuremos mais que um refúgio
para nós mesmos: às vezes
é necessária a certeza de que tudo está certo
mesmo que seja preciso
mentir para dizer a verdade.] Não

sei: os amigos não morrem quando a morte
os leva com a sua faca de cortar o gelo no diamante
dos lagos da península.

terça-feira, novembro 13, 2007

Quando o vento

é assim quando
o vento (ou o esquecimento) começa
a percorrer
as pág nas dos livr s
e v s

l

v ç



a

segunda-feira, novembro 12, 2007

e


j l ç

d

s v
h m ho m porq e
nã con ig sup rt r
est s canet s com ti ta
de evaporação
rápida.

domingo, novembro 11, 2007

somos

nenhum espelho ohlepse muhnen
evloved son nos devolve
a imagem megami a
somos euq od do que somos
verdadeiramente etnemariedadrev

sábado, novembro 10, 2007

Os brinquedos

No futuro que objectos haverão
de substituir-se às rodas dentadas de
madeira e aos automóveis de plástico
da feira dos santos com as suas quatro rodas
deslizando nas mesas de castanho? Autómatos?
Hologramas movidos no espaço
por comandos de funções múltiplas? O mundo
corre contra o passado e o seu
dédalo de fios imperecíveis. E assim
é que está certo. Quando envelhecemos
ficamos atados aos brinquedos de madeira
de pinho com rodas dentadas
a mover-se desajeitadamente nos
carreiros de saibro dos pátios.

sexta-feira, novembro 09, 2007

A paz insustentável

Na infância nenhuma máquina
ou artefacto se comparava a um helicóptero.
Nem o caterpilar com a sua pá imensa.
Os helicópteros voavam sobre os lancis ou ficavam
imóveis movendo apenas as hélices
quase silenciosas nas linhas de separação
dos passeios de cimento. Nas revistas
de banda desenhada os helicópteros por esse
tempo sobrevoavam as matas densas
do vietname. Na televisão a preto
e branco os helicópteros movimentavam
as tropas de um para outro
cenário de guerra em territórios lusos
do ultramar. Vivíamos fascinados com esse vórtice
e simultaneamente desiludidos
com a paz insustentável que se vivia na vila
entre duas linhas de fronteira
desenhadas nos passeios de cimento.

quinta-feira, novembro 08, 2007

Fotografias de viagem, 2





jcb

Fotografias de viagem, 1





jcb

Teoria

Eu disse-lhe a tua poesia assim não
pára sequer na irrisão: à demasiada prosa
dos teus versos falta densidade e sobressalto.
Eu disse-lhe a displicência deve decorrer
nunca do ofício mas
da respiração sem adornos: a prosa
ressente-se da excessiva artificialidade
dos teus elaborados versos.
Eu disse-lhe não escrevas
sobre bicicletas se temes o juízo
dos contemporâneos e a história.

quarta-feira, novembro 07, 2007

Quietude

A estranha nostalgia de um tempo
e de um lugar onde nada acontece. Um cântaro
com água reverbera o silêncio das nascentes
ou das raízes obscuras das folhosas.
Uma criança corre desamparada no terreiro
do largo e tudo fica suspenso desse voo contra
a inverosímil quietude dos nomes.

segunda-feira, novembro 05, 2007

A invenção da bicicleta

Tudo o que fizemos no domínio
dos transportes desde a invenção da bicicleta
só contribuiu para melhor compreendermos
como a bicicleta é útil e bela
e comovente. E é mais bela e útil
e comovente quanto mais
os corredores aéreos enchem os mapas
dos controladores de voo e quanto
mais os viadutos se cruzam
e sobrepõem para dar vazão às filas
de automóveis nas pontes
dos feriados. As crianças
conhecem os segredos do vento numa
roda pedaleira. As bicicletas
e os bosques abrem no verão em simultâneo
os pequenos açudes luminosos
da infância. Depois do vidro e da roda
a bicicleta foi uma das mais
belas e úteis e comoventes
invenções da história do homem.

A mesa da varanda

Joguei crapô durante três verões
porque ela gostava de jogar crapô.
Passávamos tardes inteiras sentados
à mesa da varanda do pátio. Na adolescência
o amor pode ser a raiz venenosa
do loendro crescendo por dentro
das tijoleiras das casas. Jogávamos crapô
porque sobre todas as coisas
ela gostava de jogar crapô.
Hoje não sei o que seria capaz de fazer
pelo amor. Mas sei que não passaria
três verões na mesa da varanda
do pátio a jogar crapô.

Os subterrâneos da cidade

Num sonho visitei os subterrâneos da cidade.
Somos outros depois de conhecer ainda
que em sonho os subterrâneos da cidade.
Quando lavamos os dentes ou a meio
da noite acendemos o candeeiro
da mesinha de cabeceira não
imaginamos que a água e a electricidade
chegam a casa percorrendo os
labirintos subterrâneos da cidade.
Quando ligamos o esquentador ou puxamos
o autoclismo com a displicência
de quem voga dois
palmos acima do terreno mundo
não imaginamos que o gás e o esgoto
não obstante em sentido diverso
correm nas tubagens e nas manilhas
dos subterrâneos da cidade.
Ao movermos o rato para navegar
na internet ninguém imagina
que os ratos verdadeiros e a fibra
óptica partilham as mesmas condutas
nos subterrâneos da cidade.

O teu nome

Para não cortá-los eu
pedi na casa de tatuagens
que me gravassem o teu nome
nos pulsos.