quinta-feira, agosto 11, 2011

[as Horas]

Não sei neste momento exactamente onde tenho guardado o relógio do meu avô. Procurei nas gavetas não o encontro. E no entanto cheguei a acreditar que o teria sempre momento após momento a meu lado. Comigo. No pulso ou no bolso das calças de guardar a chave de casa ou preso por uma corrente de prata a uma presilha. E no entanto neste momento exactamente não sei onde pára onde terei guardado o relógio do meu avô.

Os homens do campo sempre apreciaram os relógios enquanto objectos num certo sentido redundantes mas simultaneamente mágicos. Por trazerem uma ordem aos desacertos do tempo. Andávamos por exemplo nas encostas da presa do padre pedro a cortar nos salgueiros as varas dos cestos das uvas e o meu avô parava olhava o céu e dizia
já devem ser umas seis da tarde.
E então olhava o relógio e confirmava como se a tarde estivesse certa com a ordem natural das coisas
pois bem me parecia faltam quatro minutos para as seis.

O meu avô ofereceu-me o relógio quando estava a morrer. Procuro nas gavetas e não o encontro. E de súbito é como se mais nenhum relógio do mundo me pudesse devolver
as horas certas.

[a reunião da troika sobre o sector florestal]

jcb







[uma noite nos estradões das florestas]

jcb

terça-feira, agosto 02, 2011

[para adquirir RUMOR]

Relembro: para adquirir um exemplar de RUMOR os interessados enviam um mail para blogcacela@gmail.com indicando endereço postal completo e número de contribuinte (para ser possível a emissão de recibo). Nesse mail indicar-se-á que se procedeu já à transferência bancária (no valor de 11 euros – não é necessário comprovativo) para a seguinte conta (NIB):

0033-0000-00060303349-05.

O livrinho seguirá de imediato por correio normal.

[uma recensão a RUMOR]

[in Expresso, Atual, 30 de Julho de 2011]


Nada justifica que um poeta com provas dadas como José Carlos Barros (n. 1963) continue a publicar apenas em edições de autor ou à conta de prémios regionais. Mas o novo livro, «Rumor», é uma vez mais uma edição quase clandestina, com tiragem de cem exemplares e venda individualizada (através de blogcacela@gmail.com). Autor de «Uma Abstracção Inútil» (1991), «Todos os Náufragos» (1994), «Teoria do Esquecimento» (1995), «As Leis do Povoamento» (1996) e «As Moradas Inúteis» (2007), Barros é transmontano, vive no Algarve e mantém o blogue Casa de Cacela (http://casa-de-cacela.blogspot.com), onde apareceram originalmente vários destes poemas. A memória e a simplicidade são elementos centrais, embora coexistam com apontamentos políticos cáusticos. Os poemas, discretos e cuidadosos, estão cheios de vislumbres da infância, imagens familiares, secretos envios amorosos. O tema dos objectos antigos e dos usos antigos é recorrente, mas não existe nenhuma nostalgia, somente uma sensação de distância, madura e entristecida, face às coisas simples. Referindo-se à pintura rupestre, o autor fala de uma representação do real «contaminada pelo que sabemos». A poesia é a forma decantada dessa representação, feita de figuras enigmáticas e alusões mínimas, uma bacia de plástico com água da chuva, máquinas de luzes, uma torneira, um álamo, símbolos pessoalíssimos de um desejo urgente de pureza. A poesia, escreve Barros, é uma forma de redundância. Mas é também uma forma de evidência: «era no tempo da literatura/ dizíamos ‘a água dos tanques’/ e ficávamos à espera da reverberação dessas cinco sílabas/ ou cortávamos vagarosamente/ um ramo/ da árvore dos significados.»

Pedro Mexia

capa definitiva