quarta-feira, fevereiro 13, 2008

8.

Aline compreende que o tédio há muito enrolou nos seus pulsos os fios da trama. Aline compreende que há muito, na sua vida, o prazer deixou de ser alvoroço e exaltação. Mas Aline sabe (julga saber) que a vida não é possível sem a aceitação desses fios invisíveis que o destino vai tecendo à passagem das horas: entre a alba e a penumbra dos fins de tarde; entre a noite e o seu reverso imperscrutável; entre a aparição e o distanciado sépia dos retratos antigos. Talvez a procura da felicidade implique o prévio reconhecimento da inevitabilidade da tristeza e da incompletude. Talvez o prazer não seja mais que uma fogueira acesa no Inverno; uma lâmpada a iluminar por instantes breves as encostas da umbria; a pedra disparada; o comprimento entre duas ondas sucessivas. E Aline sente-se tentada a pensar que o tédio, provavelmente, delimita um território onde se erguem defesas contra a precariedade do prazer e as incertezas do mundo.