quinta-feira, outubro 09, 2008

25.

O mundo, em grande parte, era o rio: as casas da encosta descendo na direcção do rio; a pesca às trutas; o pequeno vale da Casa a Jusante da Ponte de Arame subindo-se das margens do Beça; os montes e as suas veredas e os seus bosques em declive reflectidos na água das presas; os freixos e os salgueiros das margens; as ervas secas do Verão e os paus arrastados pela enxurrada deixando nos ramos dos amieiros as marcas dos anéis da enchente. Mas a casa, agora [e o rio, e a árvore], não era apenas uma ruína: mas a ruína sem o mundo desse tempo. E João recorda a copa imensa da tília silvestre quase arredondada e a surpresa do avermelhado na parte superior dos raminhos jovens; e as folhas em forma de coração; e as suas flores aromáticas e quase transparentes no mês de Junho. A tília, portanto, era a mesma de sempre; metáfora do mundo; árvore dos segredos. O mais certo é que tivesse sido plantada no ano de mil oitocentos e sessenta e cinco. Porque foi em mil oitocentos e sessenta e cinco que Américo Fontes decidiu deixar a Aldeia. Nessa manhã de Março, depois da missa de sétimo dia em memória de Irene Custódio, Américo viu Joaquim Gomes sentado na pedra do adro; as golas da samarra puxadas; um cigarro vagaroso; um sorriso irónico de quem é credor das coisas do mundo. Américo sentiu o sangue a correr-lhe nas veias; lesto. E foi então que