segunda-feira, julho 10, 2006
O Verão
E no dia dezanove de Julho, à hora em que a manhã começava a nascer no oriente, os clientes do bar da praia riam-se e dançavam nus no areal em redor das tochas acesas. E era já de manhã e dançavam ainda. E nada mais importava no mundo. E quando os agentes da polícia marítima apareceram com megafones e com o ruído das vozes ampliado nos megafones, como que a procurar impor uma ordem contrária à ordem natural do Verão, uma aragem súbita ergueu-se na praia e fez-se noite de novo. E os agentes acenderam lanternas e holofotes e começaram um interrogatório exaustivo. Mas os clientes do bar da praia eram todos exactamente iguais, e tinham todos a mesma voz, e tinham todos o mesmo nome. Os agentes olhavam para os bilhetes de identidade e confirmavam por via oficial que os clientes do bar da praia tinham todos a mesma cara e o mesmo nome e a mesma idade. Foi então que se ouviu o agitar imenso de uma nuvem de corvos a aproximar-se. E quando o barulho das aves se perdeu na distância e os agentes da polícia marítima ergueram de novo a cabeça e tiraram a cara das mãos, já não havia ninguém ao balcão, e já não havia ninguém na esplanada, e já não havia ninguém nas dunas ou em redor das tochas acesas. E apenas a música se ouvia ainda misturada ao leve ruído das ondas a desfazerem-se na areia molhada.