De que se fala quando se fala dos incêndios? De que se fala quando um país é um generalizado pasto de chamas? Fala-se dos meios de combate, das férias do primeiro ministro, da dança de cadeiras nos lugares de comando em Institutos e afins, da meteorologia, do tamanho das agulhetas dos bombeiros e dos meios aéreos. Como se não houvesse uma causa para esta desgraça. Como se não tivéssemos desenhado florestas à medida do avanço do fogo. Como se o processo de ordenamento do território, nos últimos largos anos (ou, mais exactamente, a ausência de estratégias de ordenamento), não anunciasse já em letras garrafais esta e outras desgraças que depois passam em rodapé ou aos berros, como inevitabilidades, nos noticiários televisivos. Como se os pirómanos não fôssemos nós, os que nos deixámos assim alegremente comprazer num país de subsidiozinhos, de tachos, de desprezo pelo mundo rural e pelas funções biofísicas do território. Como se construir tê uns e desaguar ao fim de semana ou em férias num centro comercial a comprar roupinha com etiquetas fosse o nosso grande desígnio. O mau não é apenas que tudo arda. O mau é que os exemplos se sucedam e nos apanhem sistematicamente desprevenidos, ausentes, com mais que fazer.
No dia 5 de Agosto de 2003, no blog Um pouco mais de Sul, publiquei os posts que agora aqui se recuperam, numerados de um a seis. Peço desculpa pela insistência. Mas a verdade é que os incêndios lavram sobretudo no campo da incúria. E não haveria de fazer mal pensarmos um bocadinho nisso.