2.
Lembra-se de tocar a pele de Manuela. Era uma noite de Inverno e Manuela adormecera no seu colo. Aline olhava a mulher que tanto continuava a fasciná-la pelos segredos que ocultava (a si mesma?) na suposta transparência do que dizia; como se, despindo-se, ficasse cada vez com mais roupa a tapar-lhe o corpo que desnudava ou procurava despir. Manuela desconhecia o desejo. E Aline não compreendia como era possível alguém não sentir, não ter sentido jamais na sua pele a erupção demorada da água. E foi então que lhe tocou a curva do ombro e olhou esse rosto adormecido: essa estranha sombra num rosto adormecido. Era uma noite de Inverno. E Aline imaginava que o tédio poisara nos pulsos de Manuela a sua teia incombustível.