terça-feira, maio 10, 2011

[não devia chegar de noite]

Não devia chegar de noite a estes lugares
onde tudo o que um dia foi
parece emergir do fundo dos poços dos quintais
eco de outras vozes mais antigas
reverberação insidiosa dos segredos
palavras roídas pelo lado de
dentro das próprias frases

Fantasmas vagueiam em
silêncio contra o
fundo indefinido dos pinheiros bravos
o meu avô a colher as maçãs camoesas
e a guardá-las no cesto de vimes entrançadas da
presa das tílias
o táxi do senhor adriano a aproximar-se
vagarosamente da
bomba de gasolina
uma criança
que podia ser eu
a correr de olhos vendados nos
andaimes da obra dos bombeiros
voluntários

A sombra

mancha de óleo nas paredes das casas
cobrindo o alcatrão da estrada do rio

parece encerrar o tempo nas
suas cápsulas
de vidro

E não há um rumor
não há um único movimento
os ponteiros do relógio da torre parados a
meio da noite
entre as quatro
e as cinco horas
da tarde