segunda-feira, junho 28, 2010

PAUSA

Quando se anda em serviços mínimos, e mesmo esses começam a falhar, recomenda-se uma pausa até poder ser retomada alguma normalidade. O blog, portanto, fecha por uns tempos. Com um agradecimento e um pedido de desculpas, sobretudo aos que passam por aqui com alguma regularidade. Até breve.

quarta-feira, junho 23, 2010

[o que é dos livros]

Estás sentado de frente
para a montra de vidro
do café. Vês a rapariga de jeans
a atravessar a passadeira
do outro lado do vidro
e procuras adivinhar
uma vida por detrás
dum rosto: uma infância, um rio,
o amor, uma dança
a meio da noite. Ela pára
no passeio, suspeitas
que te olha nos olhos, imaginas
que se decide a entrar
e a sentar-se a teu lado.

Estás sentado de frente
para a montra de vidro
e deixas o romance
a meio do capítulo IX.
Ergues o olhar e olhas a rua: lá fora
uma rapariga de jeans
atravessa a passadeira
do outro lado do vidro

e por um instante
não compreendes o que é
do mundo, o que é dos livros.

sexta-feira, junho 18, 2010

[algumas cidades muito bem explicadas ao luís por mor dos títulos dos poemas]

TODAS AS CIDADES

As cidades não têm nada por si mesmo
as cidades são sobretudo
o que lá deixamos.


PARIS E AS IMEDIAÇÕES DA ÓPERA

Que mal empregadas
esplanadas
quando não estás.


LEMVIG E A ÁGUA

Como explicar
que este poderia ter sido
para sempre o meu lugar.


ROMA E AS RUÍNAS DO IMPÉRIO

Assim de repente
quase me pareceu o teu nome em latim
gravado na pedra.


LISBOA E A QUESTÃO SOCIAL

A greve da Transtejo
de uma a outra breve margem
separa-nos para sempre.


MIRANDELA E UMA TARDE DE SÁBADO

Sem este espelho de água
o que seria hoje
de nós.


COPENHAGA E A PRIMAVERA

Oferecer uma rosa
à jovem de olhos de nuvem
que vendia flores.


ANTIGUA GUATEMALA E OS DESASTRES

Assim lá estivesses 
o vulcão
era o menos.


MAPUTO NA ZONA ALTA

A embaixada 
e o tédio da secretária da embaixada
de ter numa tarde 

tão quente
perdido uma partida
de golfe.


LATINA E O AMOR

E quem nessa tarde Maria Manuel
me haveria de recordar o famoso edifício
com o M de Mussolini?


FLORENÇA E AS MÁQUINAS FOTOGRÁFICAS

Em vez da polícia
fumar um cigarro na varanda
do Palazzo Vecchio

e ser 
apanhado 
pelos japoneses.


CHAVES E O TEMPO

Percorro hoje os corredores do Liceu
como o único lugar do mundo
onde nunca estive.

[e quase não haver]

E quase não haver um verso
para acolher a luz demorada a meio da tarde
nas folhas das amendoeiras jovens.

[quase tudo]

Quase todas as coisas
a cal das paredes
a água parada nos tanques.

[ainda o amor]

Tão demorada semente aérea 
a cair em elipse:
o teu nome desse tempo.

[romance]

Barco de vagas
repetindo as palavras
em vez do vento ou da água.

[jogos olímpicos]

Fotografias antigas:
o dilema das falsas
partidas.

quinta-feira, junho 10, 2010

[Testamento de M. L.]

Deixo-te
todos os meus bens
estas páginas de rascunho
dos incêndios
das florestas.

[O capitalismo e a infância]

O sol deixou de entrar na minha rua
a luz deixou de poisar nas folhas dos freixos dos quintais
um espesso lençol de sombra cobriu as paredes
e os telhados das casas
foi quando construíram as
avassaladoras chaminés da fábrica de rebuçados
chaminés imensas
erguendo-se sobre o horizonte como
catedrais góticas
ou torres de palácio de fábula

é assim quando 
o capitalismo e a infância se misturam
eu é que nunca mais na minha vida
pude ver as guloseimas.

[A memória do Verão]

Nos cafés da província
nas mesas de resina das esplanadas
nesse espaço de circulação
entre o jogo das damas e os copos de cerveja
o Verão é ainda a haste mais insustentável
das páginas dos livros.

Como numa história de romance
as ervas azuis dos venenos
misturavam-se
ao aroma antigo das araucárias
da praça

bebíamos 
como se pudéssemos ficar para sempre
com a memória do Verão
agarrada
à inevitabilidade
de não podermos
deixar de ser jovens.

terça-feira, junho 08, 2010

[Ausências, 3]

jcb
Rio Mousse.

[Ausências, 2]

jcb
No Rio Mente.

[Ausências, 1]



Diários.

quarta-feira, junho 02, 2010

[Às vezes o poema]

Às vezes o poema deveria
apenas ser uma vereda de silvas
uma cicatriz indelével de palavras.

[Não escrever]

Não escrever a palavra cal
não escrever a palavra azul
rasurar até não ficar uma sílaba.